quinta-feira, 15 de março de 2018

Elizabeth I (1533-1603)

A mais maquiavélica das rainhas
Livro mostra que Elizabeth I abriu mão de princípios e afetos para se manter no poder e fazer da Inglaterra a potência cultural que serve de espelho ao mundo até hoje. (A FARSA)
2427-CULT-03
Ela tinha tudo para ser engolida pelo mundo. Pequena, magra, mulher, Elizabeth I (1533-1603) foi a única gravidez levada a termo por Ana Bolena, a mais detestada entre as mulheres de seu pai, o rei Henrique VIII. Aos quatro anos, viu a mãe ser assassinada sob a acusação de adultério e incesto. Entre os parentes, era chamada de pequena prostituta. Com a morte do pai, passou a ser molestada sexualmente pela madrasta e seu novo marido, até que, expulsa da casa onde cresceu pelo casal, virou para o lado oposto a direção de seu destino.
Depois da morte do irmão mais novo, último parente por quem a Rainha Virgem – assim chamada por nunca ter tido filhos ou se casado – cultivara algum afeto, nada mais impediu o projeto de poder de Elizabeth. Ela se valeu de uma cultura vasta construída com afinco no isolamento, da astúcia que só um sobrevivente pode conhecer e de, mesmo tida como bastarda por quase todo o seu país, se tornar de fato a última filha da dinastia Tudor. Em 1558, se tornou rainha. No trono, reestabeleceu o domínio protestante, ajudando a estruturação da igreja luterana em países vizinhos. No seu governo, que durou longos (para o período) 45 anos, promoveu a leitura e os estudos humanistas que deram a base para as universidades inglesas e fez da Inglaterra um dos países pioneiros na impressão e divulgação do conhecimento, algo até então  restrito à Igreja em toda a Europa
Não é por acaso que todas as peças históricas de William Shakespeare (1564-1616), alguns dos textos mais encenados no mundo até hoje, tratam de algum aspecto de seu reinado. O que a jornalista inglesa Lisa Hilton diz no livro que lança agora sobre a monarca no Brasil, porém, é que desde as narrativas do dramaturgo inglês até as séries recentes de televisão, Elizabeth vem sendo retratada como “pouco mais que uma emperucada mulher de anquinhas com uma misteriosa vida sexual”, quando na verdade ela foi a mais perfeita tradução do modelo de governante que Nicolau Maquiavel definiu em “O Príncipe”. E vai além, questionando inclusive algumas abordagens feministas sobre a vida da última Tudor: não foram as dificuldades inerentes de seu sexo nem qualquer resistência ao machismo que definiram o seu governo, mas sim os seus instintos, inteligência e ambição próprios de um ser político.
OS FINS “Elizabeth I  é hoje reconhecida como a mais fiel expressão histórica do príncipe proposto por Maquiavel. Ela não foi propriamente uma mulher excepcional. Mas sem dúvida foi uma governante excepcional. Talvez a maior que a Inglaterra já teve.”
OS FINS “Elizabeth I é hoje reconhecida como a mais fiel expressão histórica do príncipe proposto por Maquiavel. Ela não foi propriamente uma mulher excepcional. Mas sem dúvida foi uma governante excepcional. Talvez a maior que a Inglaterra já teve.”
Em muitos aspectos Elizabeth se encaixa no perfil de líder descrito pelo escritor florentino. A rainha colocou, desde tenra idade, seus objetivos como prioridade máxima de sua existência, mudando o jogo, rompendo com parceiros  e recompondo com adversários sempre que necessário. Para poder cumprir suas metas, abriu mão dos amores. Quando achou que seu reinado poderia ser ameaçado por sua prima Maria Stuart, da Ecócia, tentou arranjar um casamento que lhe favorecesse. Ofereceu à parente a mão de Robert Dudley, o conde de Leicaster, seu aliado de maior confiança e amante – talvez como mostram alguns poemas reproduzidos pela autora, o grande amor de sua vida. Como Maria Stuart não quis – esta sim, católica por convicção e fiel aos próprios princípios – mandou matar a prima e perdeu o homem que amava.
De fontes novas em relação ao livro anterior, que já tem mais de uma década, “Elizabeth I – Uma Biografia” reúne fontes desconhecidas trazidas da Itália, Turquia, França e Rússia. Uma delas é o texto “Perfit Readiness: Elizabeth Learning and Using Italian”, inédito até agora. Não existe nenhuma prova que a Rainha Virgem, apesar de todas as coincidências com as ideias  expressas por Maquiavel em “O Príncipe”, tenha de fato lido o livro. Mas sua dedicação à literatura italiana, que ajudou a traduzir e distribuir nos domínios ingleses, é mais um forte indício de que o texto político, que já circulava na Inglaterra em sua regência, estava entre as suas referências.
A escritora lembra que Elizabeth escreveu para Jaime IV da Escócia, em 1585: “Se você supõe que as causas dos príncipes podem ser encobertas porsegredo que nenhuma inteligência consegue desvendar, não se decepcione; nós, velhas raposas, encontramos um modo de nos salvar com a astúcia dos outros e de tomar conhecimento do maior dos segredos, especialmente se ele concerne à nossa propriedade.”A imagem da raposa astuta é de Maquiavel. Se não quis deixar marcas do conhecimento do texto, é porque Elizabeth conhecia o conceito do segredo  como astúcia de uma velha raposa
https://istoe.com.br/mais-maquiavelica-das-rainhas/

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