“Eleições” no modelo dependente
Adriano Benayon * - 30.03.2014
O golpe de 1964 – agora com 50 anos - consolidou o modelo dependente,
subordinado ao capital estrangeiro, instituído pelo golpe de 1954 e aprofundado
no demagógico quinquênio JK. A falsa democratização radicalizou esse modelo,
por meio de governos egressos de “eleições” também manipuladas pela oligarquia
financeira mundial.
2. Sob pena de esfacelamento do País, o povo brasileiro não deve mais
tolerar as imposições emanadas dessa oligarquia, que controla os poderes da
República e demais instituições do Estado. Há 25 anos, repete-se a farsa de
“eleições” para presidente, nas quais os eleitores praticamente
nada escolhem.
3. O real sistema de poder manobra sempre para que todos os candidatos
com chance de chegar ao 2º turno estejam comprometidos com a realização destes
objetivos: ampliar e aprofundar a desnacionalização da economia,
desindustrializá-la, servir a dívida - inflada pela composição de juros
absurdos – e propiciar ganhos desmedidos às grandes empresas
transnacionais.
4. Na primeira eleição direta (1989, ainda houve um candidato,
Leonel Brizola, fora desses parâmetros. Esse foi barrado no 1º turno,
através de expedientes, como impedir os transportes em regiões onde ele
teria maioria, e fraudar urnas, a ponto de, em MG, por exemplo, ter
ele tido zero voto em seções eleitorais às quais compareceram vários
partidários e militantes do PDT.
5. Em 1989: Collor e Lula; 1994: FHC e Lula; 1998: FHC, no 1º turno, por
meio de fraudes de fazer corar de vergonha qualquer tiranete de
republiquetas bananeiras; 2002: Lula e Serra; 2006: Lula e Alckmin; 2010: Dilma
e Serra.
6. Em 2002, o Dr. Enéas, apesar de seu escasso tempo no horário
gratuito da TV, obteve quase 2 milhões de votos para deputado federal em
São Paulo. Desenhava-se um perigo para o sistema: um fenômeno de comunicação.
7. A atuação de Enéas na Câmara foi dificultada através de todo tipo de
obstáculos e armadilhas para consumir-lhe recursos e energias, inclusive,
mediante a compra de quatro dos cinco deputados que elegera, para mudarem de
partido, através do mensalão.
8. O fim do PRONA foi armado, por meio da Lei de Barreiras, tendo o
notório Nelson Jobim mencionado o PRONA, na TV, como um “partido nanico” que
dita lei visava eliminar. Aprovada ela, após dois anos de
conchavos dirigidos pelo senador Marco Maciel, o Dr. Enéas teve de
fazer fusão com um partido maior.
9. Uma semana depois, o ministro Marco Aurélio, do STF, declarou
inconstitucional a Lei de Barreiras. Todos concordaram, e essa Lei acabou.
10. Não vem ao caso se Enéas parecia autoritário. Importa que, na
Câmara, ele se opôs a emendas constitucionais entreguistas e lesivas aos
trabalhadores e aposentados, impostas por Lula, mantendo e reforçando as
impingidas por FHC ao Congresso.
11. O sistema não tolera políticos não dependentes de seu dinheiro e da
grande mídia, mesmo que entreguistas, como o defenestrado Collor. Esse tentou,
com o sócio Paulo Octávio, comprar a TV-Manchete.
12. Tal é o poder da oligarquia angloamericana sobre o País, que até
hoje se oferece grande espaço a figuras como o nefasto FHC.
13. Os crimes contra o País cometidos na presidência de FHC são
ocultados da opinião pública, para que se ignore a extensão e a profundidade
dos danos que persistem e crescem, pois o grosso de suas políticas têm
sido mantido e ampliado nos 12 anos de Lula/Dilma.
14. Osvaldo Nobre no artigo “A privatização desmoralizada” (Monitor
Mercantil 14/03/2014), lembra que os governantes persistem nas doações: setor
elétrico, telecomunicações, ferrovias, rodovias, transportes públicos, aeroportos,
até a coleta de lixo, e o leilão do petróleo de Libra.
15. Como recorda Nobre, para privatizar o setor elétrico, o governo de
FHC argumentou que não haveria mais recursos para investir e que, com a
privatização, as tarifas seriam futuramente reduzidas. Ora, os recursos
fluíram e fluem, quase todos públicos (do BNDES), e os aumentos das tarifas
superam amplamente a inflação.
16. Roberto d’Araújo, do ILUMINA, aponta que, desde 1995, esse
aumento real é de 80% e que os absurdos se acumulam: autorizadas as
distribuidoras a contratar suas próprias geradoras, os contratos com
estatais foram trocados por outros a preços de Kw três vezes maiores; em
2001, houve o maior racionamento da história do planeta; diminuída a receita,
dada a queda do consumo, as distribuidoras foram compensadas com aumentos de
30% em 2003 e 2004; custos fixos foram majorados, como se fossem proporcionais
ao mercado, e, em função disso, os consumidores foram lesados em R$ 7
bilhões até 2010; a Eletrobrás vendia energia, de 2003 a 2007, no mercado
livre, a preços tão subsidiados, que era possível comprar 1 MWh até por
R$ 4,00 (o preço médio em 2013 foi R$ 263,09); o número de apagões
de grande porte triplicou; no Rio de Janeiro, explodem bueiros; um abstruso
sistema de leilões determina a matriz elétrica, e o número de térmicas caras, a
óleo e diesel, multiplicou-se por 6.
17. Com a queda no nível dos reservatórios das hidrelétricas, o
megawatt-hora (MWh) atingiu, em fevereiro de 2014, o incrível preço de R$
822,83 por MWh.
18. A MP 579 - que reduziu um pouco as tarifas - está
causando a falência da Eletrobrás. Essa MP faz que usinas
hidroelétricas vendam energia a preços de térmicas. O Tesouro subsidiou as
distribuidoras em mais de R$ 10 bilhões em 2013, sendo previstos mais R$ 18
bilhões em 2014.
19. Nobre assinala que, enquanto crescem os dividendos de acionistas das
transnacionais e de outros beneficiários da privatização, os sistemas de
energia não recebem investimento sequer para manutenção adequada.
20. Lembra que, em 1962, quando foi criada a Eletrobrás, os donos do
setor eram empresas privadas, pontificando a canadense Light e o grupo AMFORP.
Os serviços eram péssimos e faltava energia, apesar dos racionamentos e
da demanda reprimida.
21. Tudo isso está voltando. Sob FHC e os petistas, a Eletrobrás foi
fatiada, criando-se a EPE e o ONS para substituir diretorias da Eletrobrás, e a
geração no Sul do País foi entregue à transnacional belga, Tractbel.
22. Conforme aduz Nobre, Dilma intensifica a privatização da geração de
eletricidade, através de SPEs capitalizadas pelo Poder Público, além de criar o
Programa de Térmicas Emergenciais, no modelito Dilma–Tomalsquin de leilões que
privilegiam as térmicas.
23. Os ambientalistas silenciam diante desse horror, mas os das
ONGs teleguiadas por Londres e a FUNAI forçam que os projetos de hidrelétricas
sejam modificados para gerar muito menos energia, ao suprimirem reservatórios e
eclusas.
24. O professor Scalambrini, da UFPE, Recife, assinala que as
empresas de geração, transmissão e distribuição são “aliviadas” dos
compromissos, inclusive contratuais, pelos órgãos oficiais e agências,
como a ANEEL, que as deveriam regulamentar e
fiscalizar.
25. Nobre menciona esquemas semelhantes, que prevalecem nas
telecomunicações, desde FHC - entregues aos “amigos do Rei” - que fez
universalizar os serviços, especialmente a telefonia móvel, e
presenteá-los, através da privatização.
26. Acrescenta: “no início, euforia, todos com telefone, inclusive as
classes D e E; hoje, a maior parte das concessionárias é controlada por
transnacionais – mexicanas, italianas, espanholas - as empresas
mais processadas pelos consumidores, que praticam tarifas escorchantes e
oferecem péssimo serviço.” Cita: “Teles investem pouco no Brasil.” [1ª
página de O Globo de 9/3/14]. E [página inteira (33) no mesmo jornal]: “Lucra
aqui, envia para lá”.
27. Não foi cumprida obrigação alguma das assumidas nos contratos
de privatização das ferrovias, e aeroportos foram doados com dinheiro do BNDES.
Com as concessões rodoviárias: pedágios altíssimos, estradas precárias. Só
Dilma já privatizou 4.250 km. de rodovias (Monitor Mercantil de 27/12/13,
página 3).
28. A desastrosa infra-estrutura de transportes está associada à
da de energia. Ambas são decididas pela oligarquia transnacional, a
qual comanda a indústria do petróleo em âmbito mundial e o grosso
da distribuição de derivados no Brasil, ademais de toda a indústria automotiva
no País. Maximizar os lucros dessas indústrias constitui o objetivo
primordial das políticas públicas no Brasil.
29. Isso explica: 1) a lastimável matriz de transportes, decorrente dos
baixos e mal realizados investimentos em ferrovias e aquavias, bem como o caos
dos transportes urbanos; 2) a crescente, custosa e poluente participação dos
combustíveis fósseis na matriz energética; 3) a queda da participação do etanol
entre os combustíveis dos veículos automotivos; 4) o descaso e o boicote
à produção dos óleos vegetais, que substituiriam com vantagem os derivados do
petróleo; 5) os leilões de petróleo abertos às transnacionais, em condições
lesivas ao interesse nacional; 6) o fato de, há muito, a Petrobrás
não mais valorizar seus quadros técnicos; 7) a contenção do preço final
dos derivados de petróleo às expensas da Petrobrás; 8) o apoio às fontes
renováveis de energia dependentes de tecnologia estrangeira, como a eólica,
cujos pacotes envolvem até as obras de infra-estrutura junto com equipamentos
de geração importados.
30. Assim, fica relegada a energia da biomassa, na qual há
experiências vitoriosas, mas confinadas a proporções modestas devido ao
desinteresse dos governos federal e locais. Esse é o caso, entre outros, do
sistema UNIGEA, desenvolvido por Carlos Alberto Ferraz, continuador das
realizações de Marcelo Guimarães, em MG.
31. Esses melhoram o processo de produção de álcool em
microdestilarias, combinada com a produção de alimentos. Se fossem
multiplicados em várias regiões, o País teria fantásticos ganhos econômicos,
tecnológicos, sociais, ambientais e na saúde pública.
32. Maiores ganhos de todos esses tipos – em enorme salto qualitativo –
resultariam da produção de óleos vegetais para uso direto em motores de
combustão. A escala viável da multiplicidade de unidades produtivas
descentralizadas tem dimensão várias vezes suficiente para prover combustível a
toda a frota de veículos automotivos do País.
* - Adriano Benayon é doutor em
economia e autor do livro Globalização versus Desenvolvimento.
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