segunda-feira, 16 de abril de 2012

O que são o Judaísmo, anti-semitismo e sionismo?

Novamente se reabriu o debate sobre o anti-semitismo, anti-sionismo e judaísmo. A propaganda sionista, apoiada pelo “terrorismo mediático” dos principais meios de comunicação, manipulados pelosanctum sanctorum do governo sionista através dos tentáculos internacionais da MOSSAD, não tem poupado esforços para acusar o poeta e Prémio Nobel da Literatura Günter Grass de anti-semita por este ter cometido o “crime” de ousar qualificar o estado sionista de Israel como uma ameaça para a paz mundial.

A cartilha da propaganda sionista aconselha a acusar de anti-semita  todos os personagens conhecidos que tenham cometido o “sacrilégio” de denunciar publicamente os crimes de guerra, violações dos direitos humanos e outras monstruosidades praticadas pelo estado sionista. Paradoxalmente, até indivíduos judeus são acusados de anti-semitas, como é o caso de Noam Chomsky, Norman Filkenstein e Shlomo Sand
Reproduzimos dois textos escritos, três anos atrás, pelo académico Mateus Soares de Azevedo e uma entrevista a este ilustre investigador:

Judaísmo, anti-semitismo e sionismo.

Mateus Soares de Azevedo: Anti-semitismo, Judísmo e Sionismo
Por Mateus Soares Azevedo*,
(extraído da Folha de S. Paulo)
 
“Insensatos, prestai atenção: recebei minhas instruções com maior gosto do que se recebêsseis dinheiro, pois a Sabedoria vale mais do que todas as riquezas. Comigo estarão a glória, a opulência e a justiça. Feliz o homem que ouve a Sabedoria.”
Extraídas dos Provérbios, de autoria de Salomão, são as palavras da “Sabedoria” personificada. Elas assinalam o lugar privilegiado do conhecimento no judaísmo, tradição monoteísta que tem seu eixo num livro sagrado. A Torá contém os Dez Mandamentos, principal legislação do Ocidente dos últimos 3.000 anos. Até hoje não colocada em prática (“não usarás o Nome do Senhor em vão, não matarás, não roubarás…”), é tão central que ultrapassou suas fronteiras originais, sendo incorporada por cristianismo e islã. Distintamente dessas religiões missionárias, que buscam prosélitos entre todos os povos, o judaísmo não busca conversos e só raramente os aceita. 
O judaísmo legou também os Salmos de Davi, venerados pelos cristãos, e os livros sapienciais de Salomão. Davi fez de Jerusalém sua capital, há 3.000 anos, e Salomão construiu o Templo. Destruído em 600 a.C. e reconstruído, foi arrasado em 66 d.C. pelos romanos. O Muro das Lamentações é o que restou dele. 
 
A derrota para os romanos marca a Diáspora -a difusão dos judeus pelo mundo. Curiosamente, a despeito das tensões, suas comunidades somente prosperaram em terras do islã ou do cristianismo. Vem da Espanha muçulmana um dos ápices de sua cultura, com espetacular florescimento da mística e da filosofia, como testemunhado pelo Zohar -Livro do Esplendor-, principal exposição do esoterismo judaico, e pelas obras de Maimônides.
 
Há ainda o messianismo. Em oposição ao cristianismo e ao islã, para os quais o Messias já veio, o judaísmo sustenta que ele ainda está por vir, para implantar paz e justiça universais. Imagina-se então o fim da Diáspora.
 
Não se deve confundir essa concepção com o moderno sionismo. Sua ideologia nacionalista e expansionista é uma secularização do ideal messiânico. O sionismo não é parte constitutiva da religião; ainda hoje rabinos se lhe opõem tenazmente, como Moshe Hirsch, de Jerusalém, que prega a devolução integral das terras tomadas na Palestina.
 
De fato, entre 1947 e 1948, 1 milhão de palestinos foram expulsos de suas terras; cerca de 1 milhão de colonos originários da Polônia, Alemanha, Rússia e outros países as ocuparam. Seu argumento é que foram expulsos por invasores estrangeiros sem vínculo real com o lugar. “Minha família foi responsável pela guarda do túmulo de Davi por 800 anos”, disse-me um palestino. “Que direito têm esses recém-chegados de nos expulsar e ocupar nossa terra ancestral?” Para um observador externo não envolvido nas paixões em jogo, o argumento é irrepreensível.
 
Não se deve confundir anti-sionismo— oposição política a um nacionalismo expansionista — com anti-semitismo
 
Tenha-se em conta ainda a humilhação sistemática da população nativa, a detenção em massa de civis, o espancamento de inocentes, deportações, destruição de casas e campos de cultivo, fechamento arbitrário de escolas e instituições, ocupação militar de cidades e vilarejos. Isso sem falar dos assassinatos “seletivos”, do terrorismo de Estado -e da instalação de cercas em torno daquilo que A. Gattaz, em “A Guerra da Palestina”, chama de o maior “campo de detenção” do mundo, a faixa de Gaza, onde “vivem” mais de 1 milhão de palestinos.
 
Numa época em que tanto se fala de direitos humanos, é inacreditável que o mundo assista inerte ao seu maciço e cotidiano pisoteamento. Não surpreende que mesmo profissionais universitários e mulheres tenham começado a praticar ataques suicidas, signo de sua desesperadora situação.
 
Não se deve, assim, confundir anti-sionismo -oposição política a um nacionalismo expansionista- com anti-semitismo. Quanto a esse termo, ele é aplicado indiscriminadamente a duas realidades distintas. A primeira é de caráter religioso: trata-se da oposição que cristianismo ou islã fazem naturalmente ao judaísmo, como esse último comporta obviamente uma dimensão anticristã e antiislâmica. Não há aqui nenhum elemento racial envolvido. Seja de nosso agrado ou não, é da natureza das coisas que uma religião necessariamente exclua as outras. Essa é, ademais, a atitude tradicional dos Padres da Igreja, dos escolásticos e também dos protestantes clássicos como Lutero e Calvino, e tem como motivação a rejeição ao Cristo por parte do judaísmo oficial.
 
A outra realidade também classificada de anti-semitismo é o racismo, universalmente condenado, e que não deve ser confundido com o “anti-semitismo” religioso.Antijudaísmo (religioso; compreensível), anti-semitismo (racismo; inaceitável), anti-sionismo (político; legítimo): três realidades distintas cuja confusão engendra erros colossais de avaliação e de ação.
 
Egoismo colectivo
 
Autor: Mateus Soares de Azevedo
Fonte: artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, 14-01-2009
 
Sderot, em Israel, onde caíram foguetes Qassam do Hamas (de fabricação artesanal, alcance até 10 km e pouca precisão), era, até 1948, um vilarejo palestino. Seus habitantes foram expulsos antes da criação de Israel e confinados numa estreita faixa de terra, no sudoeste do país, na fronteira com o Egito.
Esse pequeno território, com 35 km de comprimento por 10 km de largura, é a tristemente famosa faixa de Gaza. Para lá foram levados os humilhados e ofendidos palestinos, expulsos pelos novos donos da terra, os sionistas israelenses.
Quem são os sionistas? Filosoficamente, o sionismo constitui uma das faces modernas daquela busca sempre perseguida e jamais realizada de um “absoluto” terreno. Busca crescentemente explosiva e destrutiva -nazismo e comunismo são dois outros exemplos dessa busca irracional.
Religiosamente, o sionismo representa um rompimento revolucionário com a tradição judaica. É a síntese acabada do processo de secularização do ideal messiânico e uma apostasia do judaísmo. É um desvio profano do messianismo. Politicamente, pertence à família dos totalitarismos ultranacionalistas, em sua modalidade “judaica”. Coloco os parênteses porque se trata de uma ruptura com a tradição judaica, sendo uma perversão nacionalista e xenófoba dela. De fato, judeus tradicionais são antissionistas e o consideram uma dessacralização da religião.
O sionismo é um tipo de “egoísmo coletivo”. Para nós, tudo; para os outros, nada. Se o egoísmo individual já não é bonito, imagine o coletivo… Ele tira prazer vulgar do narcisismo e do preconceito contra o estrangeiro. Caracteriza-se pela estupidez, pela superficialidade e por um máximo de brutalidade -como se pode constatar sem dificuldade hoje.
Em Gaza, a maioria de seus 1,5 milhão de habitantes é de refugiados e seus descendentes, expulsos de cerca de 350 cidades e vilarejos palestinos que foram riscados do mapa por grupos terroristas judaicos, como o Irgun, o Haganá, a gangue Stern ou, posteriormente, pelo Exército israelense. Ou seja, eles não estão ali por vontade própria, mas porque foram forçados – outro termo para descrever a situação é “limpeza étnica”.
Apesar de ser outro país, Israel controla o espaço aéreo de Gaza e suas fronteiras terrestres e marítimas. Nada nem ninguém entra ou sai de Gaza sem sua anuência. Além disso, esse bloqueio foi tornado ainda mais rigoroso -um autêntico “selamento” territorial- depois da vitória eleitoral do Hamas há dois anos. Isso aumentou ainda mais as já terríveis adversidades de seus habitantes: saúde deteriorada, carestia, desemprego de mais de 50% da população masculina. Gaza sofre o que racistas não tão antigamente chamavam de “punição coletiva”.
Quanto ao massacre militar, que alguns preferem eufemisticamente chamar de “conflito”, não há necessidade de entrar em discussão: os números por si sós são eloquentes. Mais de 900 seres humanos, a maioria civis, incluindo duas centenas de crianças, já perderam a vida em Gaza. Quatro mil feridos. A crer no ódio que corre nas veias de muitos israelenses e seus apoiadores no mundo, mais vidas estão para ser ceifadas.
Do lado israelense, uma dezena de mortos, a maioria militares. Isso dá uma proporção de 1 para 100. Como escreveu Gideon Levy no jornal israelense “Haaretz“, “é como se o seu sangue valesse cem vezes menos do que o nosso, reconhecendo nosso racismo inerente”.
Muitos questionam o que os brasileiros fariam caso o Hamas lançasse seus foguetes contra nós. Afinal, argumentam, “Israel tem o direito de se defender”.
Antes disso, devemos perguntar o que faríamos se tivéssemos sido expulsos de nossas terras e comprimidos num exíguo território. O que os brasileiros fariam se tivessem fechado hermeticamente esta área por mais de um ano, sem deixar entrar alimentos ou medicamentos nem permitir à população entrar ou sair? Falando pelos americanos, Takis Theodoracopulos, editor do site Taki`s magazine, respondeu: “O que faríamos nessa situação seria muito mais duro e eficaz do que os oprimidos, mas não vencidos, palestinos têm feito com seus Qassams”.
Takis conclui: temos sido totalmente iludidos pela poderosa máquina de propaganda sionista. Apoiar essa guerra é justificar seu cortejo de brutalidades e horrores; é ser iludido pela propaganda.
 
A criação do Estado de Israel. “Ocidente rico dá esmola com o bolso alheio”. Entrevista especial com Mateus Soares de Azevedo
IHU On-Line – Como o senhor descreve a guerra entre Israel e palestinos? Quais são as raízes desse conflito, desde o principio?
Mateus Soares de Azevedo – Vou fazer um panorama histórico da região e recuar até a época de Jesus. No ano 33 – tradicionalmente visto como ano da crucifixão de Jesus Cristo –, a região da Palestina estava sob domínio Romano. Depois da crucifixão, no ano 70, houve uma revolta judaica contra o domínio Romano e os romanos foram vitoriosos. Começa assim a diáspora judaica, ou seja, a difusão dos judeus pelo mundo, especialmente, em torno do Mediterrâneo, tanto na Europa como no norte da África. Então, essa região, até o nascimento do profeta Maomé, no ano 570, esteve sob domínio do Império Romano.
Califa Omar toma Jerusalém, a Palestina e a Síria para o Islã, para os árabes. Então, desde 738, quando o Califa Omar entra em Jerusalém, ou seja, no século sétimo, a região toda está sob domínio árabe e muçulmano, e isso se estende até o século XX. Há um pequeno interregno de algumas décadas, período das Cruzadas. No final do século XI, os cruzados tomam Jerusalém, mas 90 anos depois, em 1187, Saladino retoma Jerusalém para os muçulmanos. Então, do século VII até o século XX, a região esteve sob influência cultural árabe-muçulmana com liberdade de culto para comunidades judias e cristas que sempre viveram por ali, já que a região é sagrada, de peregrinação, para judeus, cristãos e muçulmanos.
Diferenças religiosas
Os muçulmanos têm maior abertura para essas outras religiões do que judeus e cristãos. O judaísmo tradicionalmente considera tanto o cristianismo como o islã como heresias. No caso dos cristãos, eles vêem a religião judaica como legitima, mas superada, ou seja, o cristianismo superou o judaísmo, e o islã que surgiu depois do cristianismo é uma heresia. Mas, para o islã, nem o cristianismo nem o judaísmo são uma heresia: são, sim, religiões legítimas, e o Corão, que é a principal fonte de autoridade da religião islâmica, diz que não há compulsão em matéria de religião, e que judeus e cristãos devem ser respeitados e ter liberdade de culto.
Reflexos da Primeira Guerra Mundial
Durante a Primeira Guerra Mundial, entre 1914 e 1918, a Turquia, país muçulmano que desde o século XVI controla a região da Palestina, que é então parte do Império Turco-Otomano, ou seja, muçulmano, o qual saiu derrotado da Primeira Guerra Mundial, pela França e a Grã-Bretanha. Em 1920, começa um mandato britânico sobre a Palestina; muitos dos países que conhecemos hoje não existiam, tendo sido criados após a Primeira Guerra Mundial. A Jordânia e o Iraque, por exemplo, foram criados em cima da fragmentação que as grandes potências fizeram tanto do Império Turco-Otomano, no Oriente, como do Império Áustro-Húngaro, no Ocidente. A partir de então, a Palestina ficou sob controle britânico.
Entre 1920 e 1946, houve inúmeros casos de conflitos e hostilidades entre os habitantes nativos, 95% deles eram árabes, palestinos, e menos de 5% eram comunidades judias, mas não judias sionistas, e sim religiosas, que estavam na Palestina não para fazer um Estado judeu, mas para ficar perto dos lugares santos do judaísmo: o túmulo de David, em Jerusalém, o túmulo de Abraão, em Hebron, etc. Desses 95% de árabes, cerca de 15% eram palestinos cristãos, católicos e ortodoxos.
Pressão judaica
A Inglaterra, na época em que dominava a Palestina entre 1920 e 1948, começou a sofrer pressão do lobby sionista, que surgiu no final do século XIX. O jornalista Theodor Herzl (1) começa a campanha para criar um Estado exclusivamente judeu. Pensou-se, a princípio, em comprar terras em vários lugares do mundo, só que o Herzl percebeu que não teria o apoio dos judeus religiosos se se fizesse o Estado judeu em qualquer lugar que não a Terra Santa. Começa assim a imigração ilegal sionista para a Palestina sob domínio britânico.
Conflitos entre sionistas e o Oriente Médio
Entre 1920 e 1946, houve uma série de conflitos entre os judeus sionistas recém-chegados da Europa e os habitantes nativos, os palestinos que já estavam lá há séculos. Em 1946, dois anos antes da criação de Israel, a Liga Árabepropõe à Palestina um único Estado para os judeus e os palestinos. Essa proposta me pareceu bastante razoável porque a área total da Palestina é de cerca de 26 mil quilômetros quadrados, ou seja, cerca de 10% da área do Estado de São Paulo. Assim, a proposta apresentada de dois Estados dificilmente terá viabilidade, ainda mais tendo um Estado militar e economicamente poderosíssimo como Israel ao lado de um país que nem foi constituído ainda e é miserável, como a Palestina. Os judeus sionistas que são racistas, exclusivistas, ultranacionalistas obviamente se recusaram a dividir o mesmo território com os palestinos. Em 1947, foi feita uma assembléia na ONU para discutir a partilha da Palestina, sendo que os sionistas, mesmo depois da imigração ilegal na época do domínio britânico, detinham menos de 6% da área total. Mais de 90% da área que, mais tarde, foi ocupada pelo futuro Estado de Israel pertenciam aos árabes que foram expulsos e nunca foram indenizados. Pressionada violentamente pelos Estados Unidos, que buscavam apoio econômico e político da comunidade judia americana, a ONU aprovou a partilha e a consequente criação do Estado de Israel. Pressionados pelos Estados Unidos, muitos países que votaram contra a partilha, acabaram votando a favor, dando aos sionistas 55% da área.
Corrupção legaliza terra para sionistas
Osvaldo Aranha (2), presidente da assembléia da ONU naquele momento, teria dito que o Brasil precisava preservar Copacabana para os cariocas. Com isso, ele queria dizer o seguinte: com a criação do Estado de Israel, o Brasil se veria livre dos judeus, porque eles iriam para Israel. Esse foi um argumento que os sionistas usaram para ter o apoio também dos fascistas e anti-semitas para criação do Estado de Israel. 
Segundo dados da ONU, entre 1947 e 1948, cerca de um milhão de palestinos foram expulsos de suas terras; 350 vilarejos e cidades palestinas foram riscadas do mapa. Ao mesmo tempo, um número similar de judeus chega para ocupar essa terra. Essa assembléia da ONU que decidiu pela partilha aconteceu em 29 de novembro de 1947, a famosa resolução 181 da ONU. A votação foi adiada algumas vezes para dar tempo aos pró-sionistas de virar o resultado antecipado que era contra a partilha. Isso foi feito usando todo o tipo de recursos, ameaças de retaliação comercial e cooptação; os países cooperantes foram premiados com benefícios financeiros, políticos, comerciais.  Veja o que disse nessa assembléia o embaixador do Líbano na ONU, Camille Chamoun (3): “A liberdade de voto é sagrada e não podemos abandoná-la pelo tirânico sistema de abordar delegações em quartos de hotel, corredores e ante-salas, ameaçando-as com sansões ou oferecendo propinas e fazendo promessas para obrigá-las desta ou daquela maneira. A extraordinária pressão norte-americana e de meios judaicos levou delegações de países que se já haviam pronunciados contra a proposta da partilha da Palestina, a mudar de voto em menos de 24 horas”.
Ocidente rico dá esmola com o bolso alheio
Todos os países árabes votaram contra a partilha; todos os países em torno da área conflagrada, ou seja, Grécia, Turquia, Irã também votaram contra. Com exceção do regime racista da África do Sul, a África e Ásia votaram contra a partilha. O Brasil votou a favor; outras nações latino-americanas se abstiveram: Argentina, México, Colômbia, Chile; a Grã-Bretanha, que era a potência ocupante, também se absteve porque temeu pela reação árabe, com a qual tinha uma relação privilegiada. Os maiores interessados, os palestinos, não foram sequer consultados. Foi um típico caso do ocidente rico dar esmola com o bolso dos outros; com a consciência culpada por não ter feito nada durante o regime nazista para defender os judeus, o Ocidente resolveu dar a terra dos outros para que os sionistas fizessem o seu Estado. Assim, 57% da área ficariam com os sionistas e 43% com os palestinos. É importante dizer também que os judeus palestinos sempre se opuseram aos sionistas e foram contra a criação de Israel, entre outras coisas, porque sabiam a confusão que isso iria gerar.
IHU On-Line – Além da disputa por territórios, questões políticas, religiosas ou econômicas norteiam o conflito?
Mateus Soares de Azevedo – O foco do conflito é o ultranacionalismo judaico, o sionismo que expulsa os nativos da Palestina para constituir um Estado judeu, não levando em conta que aquela terra nunca foi exclusividade dos judeus, porque os palestinos estão lá desde antes da época de Jesus. É claro que depois surgem as diferenças religiosas, mas é preciso deixar claro que se hoje existe um problema religioso entre palestinos e judeus, isso se deve exclusivamente à maneira como foi criado esse novo Estado no Oriente Médio, porque sempre houve uma relativa paz e harmonia na convivência entre as comunidades judias e muçulmanas. No final do século XV, quando os judeus foram expulsos da Espanha, a maioria foi para o mundo muçulmano, onde foram recebidos de braços abertos. As comunidades judaicas em geral, ao longo da história, floresceram principalmente no mundo do islã ou no mundo cristão, seja na Europa, América ou no mundo islâmico. Na China, Índia, África e Japão não existem comunidades judaicas importantes.
IHU On-Line – Se sempre houve essa receptividade por parte dos palestinos, quais as explicações para esse sentimento de egoísmo coletivo que atinge Israel?
Mateus Soares de Azevedo – Porque Israel foi criado pelos sionistas, os ultranacionalistas judaicos que têm uma percepção de orgulho de suas raízes, de sua cultura e de sua religião, além de um sentimento exclusivista. Então, é uma ideologia quase fascista, que despreza os estrangeiros. Nesse caso, os palestinos são desprezados porque resistem à extinção, ao aniquilamento, ao preconceito. É paradoxal que um dos exércitos mais poderosos do mundo – porque Israel é um Estado militarista que, basicamente, só produz armas e obriga a juventude a passar três anos servindo ao exército e, além disso, durante o resto da vida, todo habitante tem que servir, pelo menos um mês por ano, ao exército israelense –, que é capaz de destruir o Oriente Médio inteiro, não consegue controlar ou dominar o seu próprio território por causa de um povo humilhado, ofendido, empobrecido, mas um povo que resiste.
IHU On-Line – Como podemos entender que, em pleno século XXI, e com amplo apoio da maior nação mundial, os EUA, acontecem tais atos de terror em Gaza? Como compreender a legitimação da barbárie?
Mateus Soares de Azevedo – A propaganda sionista é fortíssima, tem um peso tremendo nos principais meios de comunicação do Ocidente, e eles impedem a divulgação da verdade. O lobby sionista na mídia e no campo financeiro é fortíssimo na Europa e nos Estados Unidos. Com essa influência, conseguem controlar a informação, e eles são muito competentes nessa área. O governo de Israel, por exemplo, não permitiu a entrada da imprensa em Gaza porque eles não só mataram milhares de pessoas como destruíram a infraestrutura da região.
IHU On-Line – As ações de Israel nos territórios podem ser classificadas de crimes contra a humanidade? Podemos dizer que a atuação de Israel nos territórios ocupados tem perfil de limpeza étnica?
Mateus Soares de Azevedo – Com certeza. Há um historiador israelense chamado Ilan Pappe, atualmente professor de uma universidade britânica, que precisou sair do país porque escreveu um livro dizendo que Israel foi um país construído em cima da limpeza étnica. É exatamente isso que acontece. Em Gaza, é óbvio que o objetivo israelense não é simplesmente atacar ou enfraquecer ou destruir o Hamas, e sim destruir a Faixa de Gaza e fazer com que os que vivem lá abandonem sua terra.
No mundo todo, hoje, há entre 15 e 20 milhões de judeus. Desses, sete milhões formam a população do Estado de Israel. E desses, cerca de um milhão de árabes palestinos vivem dentro das fronteiras de Israel. A Faixa de Gaza tem uma população de 1,5 milhão de habitantes. Assim, seis milhões de judeus vivem em Israel, outros seis milhões nos Estados Unidos, cerca de 600 mil na França, outro tanto na Rússia, Inglaterra, Argentina, Brasil, etc. Desses, apenas cerca de um terço vive em Israel. Então, o argumento que os sionistas usam de que Israel é absolutamente necessário para proteger os judeus, é falso. Se Israel é importante para proteger os judeus, por que a maioria da população judaica vive fora do país?
Os sionistas são paranóicos. Eles acham que são sempre perseguidos. A população de Israel, por exemplo, não entende como o mundo pode estar contra eles, se eles são as vítimas.
IHU On-Line – Como percebe a atuação de outros países do mundo em relação ao conflito?
Mateus Soares de Azevedo – Infelizmente, os Estados Unidos – a principal potência, mas agora enfraquecida economicamente, e que irá, ao longo do tempo, como consequência, se enfraquecer também política, cultural e diplomaticamente – foram os principais patrocinadores da criação e da sustentação de Israel. Todo ano, os Estados Unidos repassam para cada cidadão israelense, cerca de 500 dólares, algo em torno de três bilhões de dólares de ajuda a fundo perdido. Israel recebe mais da metade de todas as verbas que os Estados Unidos dão para os países pobres do mundo, sendo que Israel não é um país pobre, tendo um PIB per capita semelhante ao da Coréia do Sul e da Espanha. Os militares israelenses têm uma relação privilegiada com os americanos, os quais lideram armas sofisticadas de última geração para Israel, que muitas vezes não liberam nem para seus aliados britânicos e os aliados da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Os EUA mais fragilizado significará um Israel mais fragilizado. Aliás, a brutalidade e a sede de sangue exibidos em Gaza nestes tristes dias mostram não um país forte, mas um país com uma liderança sem equilíbrio e sem discernimento, que só tem a força bruta para mostrar. Isso no fundo é sinal de fraqueza.
IHU On-Line – Que futuro o senhor vislumbra para esses povos? Como essa sede de sangue respaldada pelo discurso de matar se projeta dentro do território palestino? Jovens e crianças israelenses e palestinas darão continuidade a essa barbárie?
Mateus Soares de Azevedo – Sou uma pessoa religiosa e penso que só Deus resolve esse conflito. Como diz um provérbio popular, “os moinhos de Deus se movem lentamente, mas eles moem incrivelmente fino” e os moinhos de Deus já estão se movendo, e moendo… vamos prestar atenção nisso! Imagine qual deverá ser a reação da população de Gaza depois de tudo o que aconteceu? Quantos não pensarão apenas em vingança? E quem poderá lhes censurar por isso, depois de verem sua cidade destruída e seus amigos e parentes mortos ou feridos? O que aconteceu em Gaza foi um massacre e um ataque covarde, porque os palestinos não podem ter marinha, exército, ou seja, eles não têm como se defender. O Hamas é como se fosse um grupo de estudantes, comparando com o Brasil da Ditadura Militar: é como se a União Nacional dos Estudantes (UNE) resolvesse resistir militarmente ao governo militar brasileiro. O Hamas é um grupo amadorístico do ponto de vista militar. Israel, um país de sete milhões de habitantes, gasta mais com armas do que o Brasil, com 180 milhões de habitantes. Então, como uma “UNE palestina” vai resistir a um dos exércitos mais poderosos do mundo? Então, é uma espiral de violência que não tem fim. Humanamente, não consigo ver uma solução para o conflito depois de 60 anos de tirania, opressão e massacres como esse. Não vejo solução diplomática para a questão, ainda mais porque os Estados Unidos e o Ocidente, em geral, sempre tomam o partido de Israel. Não vejo luz no fim do túnel, desgraçadamente.
Notas:
1. Theodor Herzl (1860-1904) foi um jornalista judeu austríaco que se tornou fundador do moderno Sionismo político.
 
 
 
2. Osvaldo Euclides de Sousa Aranha foi um político e diplomata brasileiro. Amigo e aliado de Getúlio Vargas, foi o grande articulador da campanha da Aliança Liberal nas eleições, agindo nos bastidores para organizar o levante armado que depôs Washington Luís e tornou realidade a Revolução de 1930. No processo de envolvimento brasileiro à Segunda Guerra Mundial, Aranha teve papel fundamental, representando no governo a ala pan-americanista, defendendo uma aliança com os Estados Unidos sempre em oposicão aos chefes militares, capitaneados, principalmente pelo ministro da Guerra Eurico Gaspar Dutra, que eram partidários de uma aproximação com a Alemanha. Em 1947 foi chefe da delegação brasileira na recém-criada Organização das Nações Unidas (ONU). Presidiu a II Assembléia Geral da ONU que votou pela partilha da Palestina.
3. Camille Chamoun (1900-1987) foi um político do Líbano e líder cristão maronita durante a Guerra Civil do Líbano. 

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