sexta-feira, 26 de junho de 2020

Governo Bolsonaro estaria criando uma ‘milícia política’ com a manutenção inconstitucional de contingentes reservistas, que já contariam com mais de 400 integrantes.

A Força Nacional foi criada em 2004, idealizada pelo Ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos e pelo governo Lula, tendo como objetivo sua utilização pelo governo federal em situações de distúrbio público, de ofício ou por interesse dos estados federados. Todavia, é a primeira vez que o organismo estaria sendo utilizado para a formação de uma milícia política.

Ex-coordenadora denuncia ao MPF formação de milícia bolsonarista na Força Nacional, por Maitê Ferreira

Governo Bolsonaro estaria criando uma ‘milícia política’ com a manutenção inconstitucional de contingentes reservistas, que já contariam com mais de 400 integrantes. Ex-coordenadora nacional Keydna Alves Lima Carneiro questionou a motivação do procedimento e foi destituída do cargo  - Por  Jornal GGN 25/06/2020
A tenente-coronel Keydna Alves Lima Carneiro, ex-coordenadora-geral da Força Nacional, denunciou ao Ministério Público Federal um alarmante acontecimento que ocorre discretamente dentre a instituição. Sem qualquer amparo legal ou constitucional, o governo federal estaria agregando um crescente contingente reservista, que já conta com mais de 400 integrantes. Bolsonaro também está agindo para relaxar os critérios de acesso a esses contingentes reservistas, que são remunerados e subordinados diretamente à Presidência da República: permitiu o ingresso a condenados em primeira instância em processos criminais, através da portaria 161/2020 (tais como ex-policiais militares afastados de seu cargo) e revogou a necessidade da experiência mínima de três anos, anteriormente exigida pela pela portaria 3383/13. Após questionar a situação internamente pelo menos duas vezes, a ex-coordenadora (que foi a primeira mulher a ocupar o cargo) foi destituída de cargo pelo então diretor-geral Aginaldo Oliveira, o que levou a denunciar a situação formalmente ao Ministério Público Federal: “o uso desses reservistas armados é absolutamente inconstitucional e embute uma série de riscos,a criação de uma milícia inimputável e até mesmo a infiltração de criminosos”.
A Força Nacional foi criada em 2004, idealizada pelo Ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos e pelo governo Lula, tendo como objetivo sua utilização pelo governo federal em situações de distúrbio público, de ofício ou por interesse dos estados federados. Em seu histórico, já foi acionada para guarnecer a segurança pública de estados em que ocorriam motins da Polícia Militar, e também para reprimir greves e manifestações populares que atingiam grandes proporções. Todavia, é a primeira vez que o organismo estaria sendo utilizado para a formação de uma milícia política.
A ex-coordenadora ainda alerta que a medida não tem qualquer amparo legal ou constitucional, tendo em vista que a manutenção de tropas reservistas só seria permitida mediante a vigência do dispositivo de Garantia da Lei e da Ordem, que atualmente não se encontra em vigor no país.
Esta medida é preocupante, pois demonstra que Bolsonaro está movendo as peças para arregimentar uma tropa armada, remunerada e diretamente subordinada ao seus interesses de continuidade no poder, mesmo que mediante um golpe de força. Juntamente com sua influência junto às polícias militares e setores da Polícia Federal em todo o país, ameaça a normalidade e subsistência das instituições democráticas no Brasil.
É possível considerar que o Exército, apesar de estar no Governo, deixa Bolsonaro a própria sorte e tem seu próprio projeto de poder reservado para o momento oportuno — o que pode ser mais uma vez apontado através da última declaração do General Augusto Heleno no inquérito da intervenção política da PF que tramita no STF. O chefe do Gabinete de Segurança Institucional afirmou em depoimento ao Supremo Tribunal Federal que Bolsonaro nunca teve qualquer obstáculo em substituir integrantes de sua segurança pessoal no Rio de Janeiro, destoando da versao oficial adotada pelo presidente e complicando ainda mais sua defesa judicial.
Enquanto o Exército se articula para um autogolpe e uma “intervenção militar sem Bolsonaro”, se assim chegar o momento oportuno, Bolsonaro já percebeu que não pode contar com solidariedade irrestrita das Forças Armadas e tece seus próprios esforços para arregimentar uma milícia alinhada aos seus interesses particulares. Se o Exército tem seu próprio projeto de poder, as polícias estão com Bolsonaro. A denúncia da ex-dirigente nacional da Força Nacional sinaliza que a democracia brasileira se encontra acuada por dois projetos golpistas que concorrem entre si: de um lado, o projeto de uma ditadura policial bolsonarista, e por outro, a intervenção militar articulada por Mourão desde 2017.

Referências

Maitê Ferreira – Advogada, jornalista, fotógrafa, militante, pensadora, transfeminista, irrequieta, ansiosa, utópica e construtora de um mundo novo.

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