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sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

A Constituição Brasileira partiu de quais fundamentos?


Os nossos políticos omissos e coniventes  será que mais uma vez ficaram felizes por não precisarem pensar? Temos uma Constituição que devido as vírgulas, três pontos, aspas, etc., deixam margens para "outras interpretações que tem sido cumpridas "como vira a página" pelo STF mesmo contrárias a soberania brasileira. A comunidade Baha’i praticamente elaborou toda a constituição brasileira[?] como descrito abaixo... Pode isto ter acontecido? Será que os três poderes traiu terrivelmente a sociedade brasileira? Porque até hoje ninguém comenta sobre tudo isto e investiga os fatos? E a imprensa que nada publicou?

AEN Brazil : Os Bahá'ís e a Constituinte
Os Bahá'ís e a Constituinte
Contribuição para uma nova sociedade
I. Introdução
Consciente de que a elaboração de uma Constituição representa um instrumento de celebração de um novo pacto social, onde estejam representadas todas as correntes de opinião do país, a Comunidade Bahá'í do Brasil apresenta, neste documento, o pensamento bahá'í, como sincera contribuição ao nobre trabalho ora desenvolvido pela Assembléia Nacional Constituinte.
A Constituição, por ser a Lei Maior do país, é a Carta Magna onde se entesouram os princípios jurídicos gerais, sendo a fonte de todo o ordenamento jurídico-institucional, devendo refletir a preocupação emergente de inspirar a vida em sociedade, espelhando a soberania de um estado de direito, cujo bem maior a ser protegido será a justiça, a qual, em uma primeira instância, objetiva a realização do ser humano, enquanto ser social.
Longe de assemelhar-se a uma vara de condão capaz de extirpar todos os problemas nacionais, a Carta Magna deverá conter aqueles princípios cardeais que, não menosprezando as tradições históricas e culturais da Nação, atendam às legítimas aspirações do povo, propiciem o desenvolvimento econômico e social, favoreçam a justa distribuição da riqueza e, sobretudo, instituam mecanismos para assegurar a fruição e o exercício plenos dos direitos fundamentais inerentes ao ser humano.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

O Brasil dos binômios estratégicos: uma crítica ao desenvolvimento nacional


ESG

Por Fernanda das Graças Corrêa [1]



A bandeira (...) tinha de representar também o presente, o novo regime, e o futuro. A divisa “Ordem e Progresso” cumpria esse papel. De um mundo até então dividido entre as duas tendências, com excessos de ordem sendo substituídos por excessos de progresso, passava-se, em consequência das descobertas científicas da dinâmica social do Mestre, a uma concepção que unia os dois pólos. Tal concepção era a base da nova dinâmica de confraternização universal, prenúncio da fase final da evolução da humanidade. A conciliação seria (...) aspiração atual de todo o povo brasileiro. [2]


O Progresso da Segurança: uma ordem sem desenvolvimento

É impossível dissociar a História do Brasil dos militares, sejam de natureza portuguesa, nativa ou mesmo negra. Foi baseado nesta tipologia étnica que o Exército Brasileiro afirma que sua história remonta ao século XVI, durante a Guerra de Guararapes, na qual portugueses, nativos e negros se uniram para expulsar os invasores holandeses da colônia até então portuguesa. De acordo com o historiador José Murilo de Carvalho, a crença dos militares brasileiros de que poderiam intervir na política quando julgassem necessário remonta ao período regencial. Além disso, havia uma crença de que os militares estavam identificados com o espírito nacional. [3]

Sob a égide do binômio “Ordem e Progresso”, em 15 de novembro de 1889, a República foi adotada como forma de governo no Brasil. “Daí em diante [os militares] julgaram-se donos e salvadores da República, com o direito de intervir assim que lhes parecessem conveniente” [4]. Embora o movimento que conduziu ao Golpe à Monarquia tenha contado com ampla participação de militares, não seria possível instituir a República sem o apoio da elite econômica cafeicultora da época. Tanto Carvalho quanto Penna concordam que o apoio dos latifundiários foi fundamental à queda da Monarquia. Isso significava que, promovendo a ordem, os militares estariam assegurando o progresso. Este binômio coexistiu nos diferentes governos que se seguiram no Brasil até então. Apesar das próprias divergências existentes entre Getúlio Dorneles Vargas (1930-1945 e 1951-1954) e os militares, principalmente, na década de 1950, estes últimos continuaram preservando“Ordem e Progresso” em suas doutrinas.

Para entendermos bem o pensamento que norteou a Doutrina de Segurança Nacional e que concebeu o binômio “Segurança e Desenvolvimento”, base política, econômica e social dos governos militares, temos que analisar como, sociologicamente, a política parece ser tão íntima dos militares. Segundo o sociólogo Edmundo Campos Coelho,

Forças Armadas e Sociedade Civil são expressões e componentes de algo mais profundo que as transborda: o sentido de comunidade. É este o substrato que define a natureza do elo íntimo que as atrela mutuamente. Por isso mesmo, e estando as Forças Armadas sob o impacto de fatores desagregadores que fluem da sociedade civil, a liderança militar institucional haverá de seriamente considerar a alternativa de nela intervir como condição do sucesso da regeneração estrutural da organização militar. [5]

É a própria política que legitima a participação dos militares nas diversas esferas das atividades nacionais. Isto significa que, desde sempre, os militares incorporam para si teorias a respeito da natureza da sociedade civil, da natureza da organização militar e da relação entre ambas. Ao retornarem da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), estas certezas se tornaram ainda mais evidentes para o oficialato brasileiro. Era preciso que houvesse no Brasil uma instituição militar que se preocupasse com as questões nacionais, tanto na esfera da segurança, quanto na esfera do desenvolvimento. Realizando estudos que resolvessem estes problemas, os militares estariam assegurando a ordem e o progresso. Assim, em função da conscientização militar de que o Brasil deveria exercer um papel estratégico interna e externamente, a Escola Superior de Guerra (ESG) foi criada, em 1949, durante o governo de Eurico Gaspar Dutra (1946-1951). Os militares que ali desenvolviam seus estudos e promoviam discussões passaram a absorver conhecimentos multidisciplinares que influenciaram diretamente suas visões de mundo e o próprio pensamento estratégico nacional. As aulas eram ministradas também por oficiais estrangeiros, em especial, estadunidenses, os quais colaboraram e exerceram influências sobre a Escola e os seus programas de trabalho. Segundo o general Ernesto Geisel (1975-1979), a ESG foi importante, porque conseguiu


transmitir para uma boa parte do setor civil, mais responsável, informações e estudos sobre o problema da segurança no país, mostrando que aquele não era um problema só dos militares, mas de toda a nação. (...) É a maioria da nação que vai dar os meios, os recursos etc para defender o país. Havia a noção no Brasil, e talvez ainda haja na cabeça de muita gente, de que a guerra é um problema só dos militares. No entanto, a guerra é também um problema dos políticos, dos economistas e das demais forças vivas da nação. [6]


Sobre a criação da ESG, teses se conflitam: (1) o cientista político René Armand Dreifuss sustentava que a criação dessa instituição está vinculada à ideologia estadunidense de combater o comunismo e (2) Nilson Borges, também cientista político, sustenta que a criação da ESG está vinculada a necessidade de aproximar civis e militares.

Dreiffus afirmou, que,


a ESG incorporou em solo brasileiro as idéias e as atitudes maniqueístas dominantes no cenário internacional da Guerra Fria. Como uma instituição, a ESG encorajou dentro das Forças Armadas normas de desenvolvimento associado e valores empresariais, ou seja, um crescimento cujo curso industrial foi traçado por multinacionais e um Estado guiado por razões técnicas e não políticas. [7]


Independente das motivações políticas que promoveram a criação da ESG, naquele momento, a ESG era uma das únicas instituições superiores no País, capaz de concentrar estudos nas áreas de relações internacionais, geopolítica e estudos estratégicos. Assim, mantendo as bases políticas ideológicas que remontavam o advento da República, os militares substituíram a palavra “ordem” por “segurança” e “progresso” por“desenvolvimento”. Por ser uma instituição elitizada, aqueles que compartilhavam dos ambientes desta Escola, novamente, se julgaram os únicos capazes e qualificados para promover “segurança e desenvolvimento”. Os civis que eram convidados a fazer parte dos quadros de estudos desta escola exerciam funções chave na economia nacional. “Os civis era voluntários, mas aceitos pela sua qualificação profissional, pelas funções que exerciam na vida nacional, na indústria, no comércio ou no próprio governo, inclusive no Itamarati.”[8] O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), criado em 1961, foi um dos instrumentos utilizados pelos civis e militares pertencentes ao corpo da ESG para preparar o País para o Golpe de 1964. Dreiffus afirmou, que, o IPES é “uma organização de classe que reunia a elite orgânica do novo bloco de poder e que expressava, integralmente, a ideologia subjacente aos interesses financeiro-industriais multinacionais e associados” [9].Este Instituto era a instituição, por meio da qual, os empresários preparavam documentos, seminários e filmes, que eram disseminados nas empresas, nos grêmios estudantis e nos sindicatos, para influenciar a sociedade brasileira a receber com passividade a ideologia golpista. Conforme afirma a jornalista Denise Assis, “a propaganda massiva e cientificamente preparada por aquele Instituto durante dois anos, hoje se sabe, pavimentou a queda do governo de Jango.” [10] Outra instituição importante foi o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD). Esta instituição recebia capital vindo ilegalmente do exterior e do empresariado brasileiro e financiou a campanha de conservadores com o objetivo de criar uma bancada favorável ao Golpe. A crise econômica que o Brasil vivenciava na década de 1960 associada à possibilidade de que o presidente João Goulart (1961-1964) promovesse um golpe comunista no Brasil fez com que parte do oficialato militar e parte da elite empresarial brasileira colocassem em prática o planejamento estratégico discutido e disseminado a partir dos estudos realizados na ESG. Este planejamento foi compilado por Golbery do Couto e Silva (1911-1987), transformado em livro, em 1981, pela Universidade de Brasília (UnB). É possível afirmar que Golbery foi um dos principais teóricos no preparo e na tomada do poder político em 1964. A maior parte dos generais que presidiram o Brasil compartilhava estudos e experiências com o general Golbery, em especial, o general Geisel, os quais, geralmente, realizavam trabalhos e exercícios juntos na ESG. Nesta compilação, Golbery buscou fomentar discussões e disseminar estudos, embora marcadamente ideológicos, sobre o conceito estratégico nacional. Para ele, o Poder Nacional era definido pela soma dos poderes político, econômico, psicossocial e militar. A importância de um sobre o outro se daria na variação do tempo e do espaço. De acordo com os pressupostos teóricos de Golbery, para se atender aos requisitos dos Objetivos Nacionais Permanentes (ONP) era preciso eliminar as superestruturas ideológicas e as racionalizações, especialmente, as que geram egoísmos e interesses mais agressivos. Isso significou que houve uma nova interpretação da política doméstica e da política internacional. O comunismo era uma ameaça para a estabilidade política e também para a estabilidade econômica nacional. A relação militar-empresariado compreendeu, que, o comunismo, ao propor reformar as bases sociais da sociedade, se tornava ainda mais atraente. Assim, se os militares também reformassem as bases sociais do País, o comunismo deixaria de ser tão atraente. Com o apoio do empresariado, os militares, nas décadas de 1960 e 1970, maximizaram aproximações comerciais com os Estados Unidos e com a Europa. Grande papel também tiveram nestas aproximações os diplomatas, os quais atuaram, no cenário internacional, com maior autonomia. Foi neste período que houve um surto de consumo de eletrodomésticos no Brasil. A entrada destas empresas estrangeiras no Brasil contribuiu demasiadamente para amenizar a sensação de instabilidade política e a ilusão de uma economia em crescente ascensão. O sucesso relativo da permanência dos militares no início da década de 1970, em especial, em função do chamado Milagre Econômico Brasileiro, serviu também como justificativa para a permanência dos militares no poder ao longo da década de 1970 e da década de 1980. De acordo com o planejamento estratégico de Golbery, chegando a este estágio, de relativa segurança e desenvolvimento, havia chegado o momento de devolver o poder político aos civis. Segundo Geisel, uma das maiores decepções de Golbery em relação ao general João Batista de Oliveira Figueiredo (1979-1985) foi que este não deu continuidade ao planejamento estratégico, do qual ambos participaram da preparação. O ápice da decepção foi o frustrado atentado terrorista no Rio de Janeiro, em 30 de abril de 1981, quando ocorria um show comemorativo ao Dia do Trabalho, no Riocentro, e uma bomba explodiu. Golbery queria que Figueiredo apurasse o atentado, mas, segundo Geisel, “Figueiredo preferiu ficar com os companheiros do Exército em vez de apurar direito o fato. Mandou apurar, mas a apuração foi tendenciosa.” [11] De acordo com o inquérito oficial, os militares que foram feridos transportando a bomba no carro, mesmo sendo do Destacamento de Operações de Informações do 1º Batalhão da Polícia do Exército [12], foram vítimas de um atentado terrorista. Nas palavras de Geisel: “ali Figueiredo fez uma opção. Figueiredo tinha sido muito soldado, tinha suas ligações com o Exército e possivelmente colocou isso em primeiro lugar.” [13] Para Golbery, Figueiredo havia recrudescido na tarefa de realizar a abertura política, o que significava uma traição aos princípios que haviam norteado a formulação do planejamento estratégico que compartilharam desde a década de 1950. Após o incidente no Riocentro, Golbery pediu demissão do cargo de ministro da Casa Civil, cargo que ocupava desde 1974. Em 15 de março de 1985, após o falecimento de Tancredo Neves, José Sarney assumiu a presidência da República. Sarney assumiu a presidência, mediante um país instável político e economicamente. Independente das variáveis que motivaram Figueiredo a abrir mão da continuidade dos militares no poder, encerrava-se junto com o mandato de Figueiredo o planejamento estratégico elaborado no seio da ESG. A saída dos militares do poder, por meio de uma política conciliatória, foi positiva para a segurança da própria redemocratização, pois, ao mesmo tem que anistiava torturadores, anistiava também militantes políticos.

Nem Segurança nem Desenvolvimento

O governo de Sarney foi um governo de transição, no qual, este presidente foi forçado a mediar diversos interesses a fim de que o processo de redemocratização não fosse ameaçado. Os cientistas políticos Jorge Zaverucha e Eliezer Rizzo de Oliveira concordam que o governo Sarney se caracterizou por uma tutela militar, na qual os militares pressionavam e ameaçavam o Governo, a sociedade e o Congresso Nacional ao se apresentarem como os condutores que asseguravam o apoio ao presidente Sarney e ao sistema político. [14] No entanto, há de se considerar que por ser um processo de transição política, o próprio papel das forças armadas se encontrava indefinido naquele momento. Não havia uma Constituição que fosse válida para aquele momento. Apesar da promulgação da Constituição de 1988, o papel das Forças Armadas brasileiras permaneceu indefinido. De acordo com a Constituição,


as Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem. [15]


Contudo, em nenhuma parte a Constituição menciona o papel estratégico das Forças Armadas. Ao longo da década de 1990, os investimentos e o apoio à defesa nacional foram escassos. A palavra “segurança” passou a ser um termo extinto do vocabulário do Governo. A aproximação política e econômica com os EUA, de forma unilateral, promoveu um processo de desnacionalização do País, caracterizado, em especial, pelo Programa Nacional de Desestatização. Na política internacional, o discurso neoliberal e global vencia os discursos mais nacionalistas. O papel das Forças Armadas passou a ser irrelevante no continente americano diante desses discursos. Na política doméstica, discutia-se, inclusive, o fim das Forças Armadas. Salvos alguns projetos estratégicos militares, levados a cabo pelo esforço orçamentário das próprias forças, como os aviões de caça do consórcio italiano AMX e o projeto do submarino nuclear brasileiro, raros foram os discursos e argumentos favoráveis às Forças Armadas nacionais. Embora os governos que se seguiram ao longo da década de 1990, em especial, os do sociólogo Fernando Henrique Cardoso, tenham seguido um planejamento estratégico de curto prazo, faltou a instituição de um planejamento estratégico a médio e longo prazos. Além disso, diferente do movimento político que ocupou o Governo na década de 1960, os grupos políticos que assumiram o Governo na década de 1990, desconsideram uma maior participação social nas discussões estratégicas. Toda esta combinação contribuiu para distanciar ainda mais a relação dos militares com a sociedade civil. Nas palavras de José Murilo de Carvalho, a sociedade permaneceu “bestializada” diante dos acontecimentos políticos que seguiram no País. A política continuou a fazer parte, exclusivamente, do ofício dos políticos.


Por o Brasil ser um país, histórica e culturalmente, submisso aos valores estrangeiros, iniciativas de desenvolvimento científico e tecnológico nacional eram percebidas pelos políticos como obsoletas e de pouca valia para o desenvolvimento nacional. Poucos foram os governos brasileiros, ao longo do século XX, que, priorizaram tecnologias nacionais ao invés das estrangeiras. O termo ciência, ora pertencia ao vocábulo do Governo brasileiro, ora havia outras prioridades.


A Inovação como caminho para o Desenvolvimento


Diante da crise econômica no final da década de 1990 e do próprio fracasso em que se encontrava a economia nacional neste período, uma reflexão social mais nacionalista e antiestadunidense tomou parte do cenário político regional. Esta reflexão assentou-se em países como Argentina, Bolívia, Brasil, Equador, Peru, Uruguai, Venezuela. No Brasil, em especial, esta reflexão repercutiu na ascensão de Luís Inácio Lula da Silva (2003-2010), ex líder sindical que concorria para a presidência do Brasil desde 1989, pelo Partido dos Trabalhadores. Nestes discursos mais nacionalistas, o presidente Lula afirmava ser a ciência a promotora do desenvolvimento sócio econômico nacional. Por os binômios estratégicos, como “ordem e progresso” ou “segurança e desenvolvimento” ser algo inerente a instituição política nacional, poderíamos afirmar que “ciência e desenvolvimento” seria o novo binômio estratégico que o Governo brasileira estaria pautando. Afinal, foi a partir do Governo Lula que a ciência ganhou o status de política de Estado. Numa análise do economista Renato Dagnino sobre o discurso de Lula para a comunidade científica, em 2007, é possível depreender como o Governo buscou envolver a ciência e o desenvolvimento nacional. Importante destacar que Lula e seu ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, se encontravam no Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE) a fim de visitar o Laboratório de Integração e Testes. Nesta visita, o presidente do INPE, Gilberto Câmara, anunciou a data de lançamento do terceiro satélite do Programa Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres (CBERS-2B). De acordo com Dagnino, Lula discursou o seguinte:


(...) na medida em que nós não fizemos lições que outros fizeram [alfabetização, reforma agrária, distribuição de renda], nós somos um país dividido entre gente que participa do Brasil de ponta, tecnológico, avançado, como todos vocês participam. Ao mesmo tempo, temos um país onde o estoque de pessoas marginalizadas começa a causar preocupação e incertezas na sociedade. (...) O desafio que está colocado para nós, agora, depois de visitar o INPE, é provar que nós somos capazes de fazer isso


Dagnino afirma que, foi “a primeira vez que um governante se refere com tal densidade política a aspectos que, é importante enfatizar, quase nunca são reconhecidos - e, muito menos, mencionados” [16]. Para uma análise mais profunda sobre o papel das elites no Brasil podemos citar o economista Luiz Carlos Bresser Gonçalves Pereira. Bresser-Pereira afirmava, que,


o desenvolvimento só é possível a partir de uma estratégia nacional: os países hoje desenvolvidos alcançaram esse estágio porque tiveram e ainda têm um claro conceito de Nação, e porque seus cidadãos não têm dúvida quanto ao dever do governo de defender o trabalho e o capital nacionais. [17]


Bresser-Pereira acrescenta que, as elites brasileiras, alienadas e cosmopolitizadas, eram co-responsáveis pelo atraso econômico brasileiro. Apesar do salto qualitativo em matéria de ciência e tecnologia, o Brasil ainda possui graves problemas sociais. Tanto Dagnino quanto Bresser-Pereira concordam que as elites brasileiras continuam desinteressadas pelas questões nacionais, o que Lula apontou como um problema estrutural e que se configura como uma barreira ao desenvolvimento. Dagnino concluiu sua análise sobre o discurso de Lula afirmando, que, “seu tom [o de Lula] pareceu sinalizar para uma inflexão na política de C&T que abra espaço para o engajamento da comunidade de pesquisa de esquerda na construção de um Brasil mais justo e democrático” [18].


O subdesenvolvimento atravessou o século e persistiu como vocábulo de maior importância no discurso e nas práticas governamentais. Recentemente, outra palavra tem ganhado cada vez mais status de política de Estado: inovação.


Em discurso de posse à presidência, Dilma Rousseff (2011-), ex militante política nos tempos da ditadura, afirmou o seguinte:


temos avançado na pesquisa e na tecnologia, mas precisamos avançar muito mais. Meu governo apoiará fortemente o desenvolvimento científico e tecnológico para o domínio do conhecimento e para a inovação como instrumento fundamental de produtividade e competitividade do nosso país. [19] 


Em 1993, promulgou-se uma lei que pode ser considerada um marco inicial nas políticas públicas de incentivo à ciência, tecnologia e inovação. [20] Contudo, estas políticas, que concediam incentivos fiscais às atividades de pesquisa e desenvolvimento, se destinavam mais ao setor industrial. Atualmente, houve uma compreensão no Brasil, por parte das próprias comunidades científica e empresariais, que, sem a capacidade de inovar, qualquer conhecimento científico se torna vulnerável no tempo e no espaço. De acordo com a economista Ana Célia Castro, “a opção pela inovação deve ser “radical”, subordinando a política científica e tecnológica e a busca de solução para os desequilíbrios regionais e sociais, tais como a fome e a miséria” [21]. Corroborando com tal afirmação, podemos citar também a pesquisa realizada por Luiz Ricardo Cavalcante, técnico de planejamento e pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas Setoriais, de Inovação, Regulação e Infraestrutura (DISET) do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), “há um amplo reconhecimento da associação entre inovação e desenvolvimento econômico e social, bem como da necessidade de se adotarem políticas públicas de inovação, formando-se uma espécie de “consenso difuso” dificilmente contestado” [22]. O que Cavalcante considera um“dissenso confuso” é a ausência de uma estrutura institucional adequada à implementação das políticas públicas de inovação. Ele conclui seu trabalho afirmando, que, é preciso evitar a pulverização de recursos e estabelecer prioridades aderentes às necessidades do país.


É possível perceber que, ainda no atual Governo, não há um consenso para a formulação de um planejamento estratégico nacional, com conceitos e diretrizes próprias. No entanto, é possível perceber um esforço de setores do Governo para fomentar e institucionalizar incentivos à inovação seja em âmbito cultural, social, econômico, político, científico, tecnológico e militar. Se quisermos mensurar o Poder Nacional atual, não podemos deixar de citar qualquer uma destas variáveis.


Exemplificando este esforço podemos citar o Índice de Qualidade do Desenvolvimento (IQD), o qual é uma pesquisa mensal realizada pelo IPEA que busca captar “se o desenvolvimento vivido pelo país contempla os requisitos de crescimento econômico com distribuição dos frutos do progresso” [23]. Este Índice é analisado mediante a três variáveis: qualidade do crescimento, qualidade da inserção externa e qualidade do bem-estar. O IQD referente ao mês de agosto registrou elevação no nível de desenvolvimento nacional, contudo, o Brasil ainda se encontra numa área de instabilidade. De acordo com o assessor técnico da Presidência do IPEA, Sandro Sacchet de Carvalho, este Índice “é uma ferramenta para discutir quais caminhos o desenvolvimento brasileiro percorre e para estudar correções na sua trajetória” [24].


O Governo de Dilma apresenta-se como uma continuidade das reformas de bases instituídas pelos dois mandatos presidenciais de Lula. De fato, as políticas assistencialistas têm contribuído para elevar o nível de desenvolvimento sócio econômico nacional. Com maiores oportunidades de acesso à educação, a sociedade está se tornando mais capacitada e qualificada para julgar aquilo que é de interesse nacional, podendo assim, auxiliar o Governo na formulação de uma política estratégica que atenda aos reais anseios da nação.


Se pudermos ousar em denominar o binômio estratégico que evoluiu com história e acompanha o novo momento vivenciado pelos brasileiros, poderíamos convencioná-lo de“inovação e desenvolvimento”. Ao que parece, este binômio estratégico é o que norteará o futuro planejamento estratégico nacional.


Ainda não é possível se vislumbrar um esboço do que seria um planejamento estratégico nacional, tal como fizeram os militares, na década de 1950, mas é possível perceber uma maior ascensão e uma participação social nas tomadas de decisão política, tal como idealizava Golbery em suas complexas reflexões sobre os problemas nacionais.


Renovação do pensamento estratégico militar ou uma Nova Defesa?


No que se refere ao planejamento estratégico militar, ao que parece, os militares estão bem mais avançados do que a sociedade civil. A dúvida sobre este planejamento estratégico recai na questão se é uma continuidade do pensamento militar produzido a partir do seio da ESG ou uma nova reflexão sobre a Defesa que o Brasil necessita. Diante das perspectivas e expectativas políticas, econômicas e sociais atuais de crescimento, pensar estrategicamente em defesa se torna imperativo. Desde a década de 1990, o Brasil dispõe de duas políticas de defesa nacional. Em dezembro de 2008, o Ministério da Defesa lançou a Estratégia Nacional de Defesa. Em breve, o Ministério da Defesa lançará o Livro Branco da Defesa. A participação de especialistas, acadêmicos, empresários e políticos vêm ganhando cada vez mais espaço nas discussões em torno da Defesa Nacional.


Como elucidado, Golbery já vislumbrava desde a década de 1950 a participação da sociedade civil nas questões ligadas à política internacional. Geisel, seu parceiro indubitável, também elucidou que a Guerra era importante demais para ser ofício exclusivo dos militares. Contudo, se já havia um pensamento que ilustrava a participação da sociedade civil nos assuntos militares, o que há de novidade no planejamento estratégico a médio e longo prazo das Forças Armadas? Como foi demonstrado, há políticas de incentivo à inovação em diversas esferas das atividades sociais. A maior democratização dos assuntos referentes à defesa, a nova orientação das políticas de alianças regionais em matéria de defesa, a priorização de processos de absorção tecnológica, uma maior valorização da cultura nacional, possibilitando a criação de uma cultura de defesa entre outros podem ser consideradas variáveis que configuram um novo pensamento em matéria de defesa no Brasil. Além disso, ao que parece, os militares têm se demonstrado em conformidade com as suas funções constitucionais, mesmo em momentos de desordem e instabilidade política, como os que ocorreram no início da década de 1990.


As relações entre militares e civis têm se tornado cada vez mais densas e eficientes em matéria de defesa. Além disso, por suas vastas experiências em matéria de desenvolvimento científico e tecnológico, os militares têm se tornado cada vez mais úteis em programas científicos e tecnológicos de outros setores produtivos. Isso significa que as preocupações com o desenvolvimento sócio econômico nacional têm se tornado cada vez mais importante em relação aos ressentimentos em função da ditadura.


Conclusão


Como bem salientou Lincoln Penna, já no início do século XX, “é bem verdade que os militares tinham crédito junto a população da capital. A trajetória da corporação garantira a admiração e o respeito popular” [25]. Aprofundando ainda mais sua análise sobre o perfil do povo brasileiro, Penna cita Gilberto Freyre. Segundo este, “os nascidos ainda no tempo de Pedro II, mas crescidos sobre a presidência de Deodoro e sob a de Floriano, foi como cresceram: sob o encanto da figura de soldado” [26]. Geisel também deu mostras de que os militares eram intrínsecos à política, ao responder a pergunta de Maria Celina D’Araújo e Celso Castro “como fica a relação dos militares com a política dentro da Doutrina da ESG”. Geisel respondeu a pergunta narrando a história que o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco (1964-1967) contava sobre as vivandeiras:


quando os políticos começavam a aliciar, a sondar os militares, ele [marechal Castelo Branco] vinha com a história das vivandeiras batendo nos portões dos quartéis. As vivandeiras eram as mulheres que acompanhavam o Exército na Guerra do Paraguai, eram as lavadeiras, as que viviam ali por perto da tropa. Castelo dizia que os políticos eram as vivandeiras porque toda vez que o político começa a se exacerbar nas suas ambições ele logo imagina a revolução. E a revolução é feita pelas Forças Armadas. Por isso ele vai bater na porta do quartel, vai procurar seduzir o militar. [27]


Como podemos perceber é inegável o fato de que o militar é visto pela sociedade com relativo prestígio. Isso faz parte da cultura nacional desde antes do advento da República. Contudo, por suas reflexões pairarem em instituições elitizadas, seus pensamentos estratégicos sempre estiveram alheios dos reais anseios da sociedade brasileira. No entanto, por ser um aspecto sócio cultural, apesar da ditadura e dos ransos advindos deste momento histórico, a sociedade brasileira, de uma maneira geral, apóia as iniciativas das Forças Armadas. Há um esforço por parte de alguns setores militares em convencer os demais de que, ao incluir os diversos setores da sociedade civil, inclusive, o povo, nas discussões em matéria de defesa nacional, conseguirão o apoio e os recursos necessários para a manutenção de seus projetos estratégicos. A fim de fortalecer este vínculo com a sociedade civil é notória a participação de militares em projetos estratégicos civis. Como vimos, já faz parte da cultura nacional a simpatia pela figura do militar. Ao fortalecermos cada vez mais os laços, que nos são naturais, mais o País tem a ganhar com esta relação. O subdesenvolvimento ainda é uma herança estrutural que o Brasil precisa resolver e sua erradicação é a tarefa de todos os brasileiros, sejam eles civis, sejam eles militares.

Notas e referências bibliográficas

[1] Doutoranda na área de Estudos Estratégicos do Programa de Pós Graduação em Ciência Política e pesquisadora do Grupo de Base Logística de Defesa do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense. Currículo Plataforma Lattes: http://lattes.cnpq.br/0706169752320464.

[2] CARVALHO, José Murilo de. A Formação das Almas: o imaginário da República no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. P. 113

[3] PENNA, Lincoln de Abreu. O progresso da ordem: o florianismo e a construção da república. Rio de Janeiro: E-Papers, 2008. P. 44.

[4] CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. P. 22.

[5] COELHO, Edmundo Campos. Em busca da identidade: o Exército e a política na sociedade brasileira. Rio de Janeiro: Record, 2000. P. 169.

[6] D’ARAÚJO, Maria Celina. CASTRO, Celso. (Org) Geisel. Rio de Janeiro: FGV, 1997. P. 109.

[7] DREIFUSS, René Armand. 1964: a conquista do Estado. Petrópolis: Vozes, 1981. p. 79

[8] D’ARAÚJO, Maria Celina. CASTRO, Celso. (Org) Geisel. Rio de Janeiro: FGV, 1997. P. 108.

[9] DREIFUSS, René Armand. 1964: a conquista do Estado. Petrópolis: Vozes, 1981. p. 482.

[10] ASSIS, Denise. Propaganda e cinema a serviço do Golpe (1962-1964). Rio de Janeiro: Mauad. FAPERJ, 2001. p. 22.

[11] D’ARAÚJO, Maria Celina. CASTRO, Celso. (Org) Geisel. Rio de Janeiro: FGV, 1997. P. 436.

[12] O Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna, subordinado ao Exército Brasileiro, funcionava em, praticamente, todos os estados brasileiros. No Rio de Janeiro, o DOI funcionava no 1º Batalhão da Polícia do Exército. Neste local, foram presos, torturados e/ou assassinados militantes da luta armada.

[13] D’ARAÚJO, Maria Celina. CASTRO, Celso. (Org) Geisel. Rio de Janeiro: FGV, 1997. P. 436.

[14] OLIVEIRA, Eliezer Rizzo de. SOARES, Samuel Alves. Forças Armadas, direção política e formato institucional. In: D’ARAÚJO, Maria Celina. CASTRO, Celso. (Org). Democracia e Forças Armadas no cone sul. Rio de Janeiro: FGV, 2000. P. 101.

[15 Constituição de 1988. Capítulo II. Das Forças Armadas. Art. 142. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>.

[16] Dagnino avalia discurso de Lula sobre Ciência e Tecnologia. Agência Unicamp, 29 de março de 2007. Disponível em http://www.unicamp.br/unicamp/divulgacao/2007/03/30/dagnino-avalia-discurso-de-lula-sobre-ciencia-e-tecnologia.

[17] BRESSER-PEREIRA, Luis Carlos. Do ISEB e da CEPAL à Teoria da Dependência. Anais do X Encontro Nacional de Economia Política. V. 1, 2005. P. 21. Disponível em < http://www.sep.org.br/artigo/xcongresso87.pdf >.

[18] Dagnino avalia discurso de Lula sobre Ciência e Tecnologia. Agência Unicamp, 29 de março de 2007. Disponível em http://www.unicamp.br/unicamp/divulgacao/2007/03/30/dagnino-avalia-discurso-de-lula-sobre-ciencia-e-tecnologia.

[19] Discurso de Dilma Rousseff ao Congresso Nacional, em 1° de janeiro de 2011. Disponível em < http://pt.wikisource.org/wiki/Discurso_de_Dilma_Rousseff_ao_Congresso_Nacional_(1%C2%B0_de_janeiro_de_2011)>.

[20] Lei no 8.661/1993

[21] CASTRO, Ana Célia. Brasil em Desenvolvimento: economia, tecnologia e competitividade. Volume I. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2005. P. 262.

[22] CAVALCANTE, Luiz Ricardo. Consenso difuso, dissenso confuso: paradoxos das políticas de inovação no Brasil. P. 29. In: 13º Boletim Radar, Diretoria de Estudos e Políticas Setoriais, de Inovação, Regulação e Infraestrutura. Abril de 2011. Disponível em < http://agencia.ipea.gov.br/images/stories/PDFs/radar/110509_radar13.pdf>.

[23] A qualidade do desenvolvimento brasileiro volta a aumentar. Índice de Qualidade do Desenvolvimento. Ano III, N° 8, agosto de 2011. Disponível em < http://www.ipea.gov.br/portal/images/IQD_Agosto.pdf>.

[24] Melhora a qualidade do desenvolvimento brasileiro. Site do IPEA, em 1° de novembro de 2011. Disponível em < http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=11177&catid=4&Itemid=2>.

[25] PENNA, Lincoln de Abreu. O progresso da ordem: o florianismo e a construção da república. Rio de Janeiro: E-Papers, 2008. P. 180.

[26] PENNA, Lincoln de Abreu. O progresso da ordem: o florianismo e a construção da república. Rio de Janeiro: E-Papers, 2008. P. 180.

[27] D’ARAÚJO, Maria Celina. CASTRO, Celso. (Org) Geisel. Rio de Janeiro: FGV, 1997. P.P 111-112.


CORRÊA, Fernanda das Graças. O Brasil dos binômios estratégicos: uma crítica ao desenvolvimento nacional. Revista Eletrônica Estratégia Brasileira de Defesa – A Política e as Forças Armadas em Debate, Nº 50, Rio, 2011 [00-28-11-1983].

sábado, 19 de fevereiro de 2011

ELES FRAUDARAM A CONSTITUIÇÃO!

A base dar votos ao governo é normal; entregar a honra do Congresso ao  Planalto é uma vergonha! Ou: ELES FRAUDARAM A CONSTITUIÇÃO! 

A base aliada apagou ontem, (18/02/2011) por 300 votos a 117, um trecho da Constituição.

Vamos botar a bola no chão. Muito do que se viu na votação do novo salário mínimo é parte da política, goste-se ou não do resultado. Ninguém pode censurar o governo por ter mobilizado a sua base e garantido um resultado realmente avassalador quando se comparam os votos. Tendo também a dar pouca bola para conversas como: “O governo pressionou; o governo ameaçou; o governo isso e aquilo…” O Executivo tem o direito de cobrar fidelidade de seus aliados. Se a lei lhe faculta a nomeação de cargos políticos, não vejo nada demais em que sejam usados para que se garanta o resultado que se quer no Congresso. O que é indecente é a quantidade de cargos ocupados sem concurso, aí sim. Adiante!

Eu já escrevi aqui algumas vezes que a oposição não tinha a menor chance de emplacar um mínimo diferente dos R$ 545 — e continua a não ter no Senado. O governo pode obter 50% a mais dos votos de que precisa. Assim, reitero que a votação representa a chance de fazer uma crítica ao governo que é de natureza política. Por que as contas do governo estão tão apertadas? Por que se vai tentar fazer um corte de R$ 50 bilhões no Orçamento? Ah, sim: não vai adiantar o senador Aécio Neves (PSDB) propor R$ 560 para demonstrar que é um bom moço e não um “radical” que quer logo R$ 600… O pão seco de Dilma, senador, é o mesmo sem manteiga ou sem margarina…


Absolutamente anormal, impressionante mesmo, é a Câmara ter aprovado, por 350 votos a 117, a consciente e deliberada violação da Constituição, que estabelece que o salário mínimo é definido por lei — e, pois, tem de ser votado pelo Congresso. No projeto do governo, encampado com uma pequena mudança malandra pelo relator, deputado Vicentinho (PT-SP), o valor será definido pelo Executivo por meio de decreto, com base na tal equação acertada com as centrais: correção da inflação mais crescimento da economia dois anos antes.

Vamos ver.

Qual foi o truque a que recorreu o governo, com a ajuda de Vicentinho? Enviou um projeto de lei — e salário mínimo só pode ser definido assim — estabelecendo que, até 2015, o mínimo será definido por decreto. Entenderam? Na prática, o governo recorreu à Constituição para fraudar a Constituição. Se alguém decidir apelar ao Supremo, e isso certamente se fará, não é possível que o expediente prospere. Se a moda pega, tudo o que, na Constituição, depende de lei pode passar a ser decidido por decreto! Basta, para tanto, votar uma lei!

Para mudar a Constituição, são necessários três quintos dos parlamentares em duas votações em cada Casa. Só pode ser feito por meio de emenda constitucional. O PT descobriu um caminho para mudar a Carta usando um simples projeto de lei, por maioria simples. É UM GOLPE NA CONSTITUIÇÃO! 

Atenção! Nem estou entrando no mérito do conteúdo, e posso fazê-lo, sim: trato de uma questão formal, legal e constitucional. Essa é uma prática consagrada por Hugo Chávez, na Venezuela: usa a lei contra a lei, usa a Constituição contra a Constituição. E que se faça aqui o reconhecimento: deve-se ao deputado Roberto Freire (PPS-SP) ter apontado o absurdo!

Reitero: a questão do salário mínimo, em si, é o de menos. O governo está testando um método. Se Câmara e Senado condescenderem com a fraude constitucional e se o Supremo também aceitar, Dilma pode governar o Brasil por decreto se quiser. Como na ditadura.
Reinaldo Azevedo

A Lei da Acochambração. Ou: Jucá, o jurista juramentado em governismo
“A oposição está enganada. O salário mínimo deste e dos próximos anos está sendo definido por esta lei, o que o decreto vai fazer é o desdobramento desta lei”.

A frase acima é do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). Jucá não está enganado. Está tentando enganar. A ser como ele quer, o que se votou ontem, então, foi uma espécie de lei delegada: pelos próximos quatro anos, o Congresso renuncia a uma prerrogativa e a transfere para o Executivo.

Insisto: se é possível fazer isso com o salário mínimo, é possível fazê-lo com qualquer outro tema que seja regulado por lei.

Olhem aqui: se há coisa que, para mim, funciona como índice de país bananeiro são essas acochambrações legais promovidas por autoridades, que, como todos nós, não podem fazer, sem punição, o que a lei veta e, à diferença de nós, só podem fazer o que está previsto em lei.

E a Carta Magna é muito clara: o salário mínimo tem de ser decidido por lei, no Congresso, não por decreto presidencial, ainda que, malandramente, como fez Vicentinho, se coloque no texto que o Executivo editará um decreto “na forma desta lei”. É mero truque! Trata-se de uma vigarice jurídica.

Aliás, ao recorrer a tal expediente, o próprio relator admitia a inconstitucionalidade do que estava sendo votado. Ele só estava… acochambrando!
Reinaldo Azevedo

O PMDB e o futuro: quem se une a favor também se une contra
O PMDB tem 77 deputados. Todos disseram “sim” à proposta do governo do salário mínimo e “não” aos R$ 600 do PSDB e aos R$ 560 do DEM. Também devem ter votado unidos contra o destaque do deputado Roberto Freire (PPS-PE), que simplesmente buscava retirar uma inconstitucionalidade da lei.

O discurso do líder do partido, o patriota Henrique Eduardo Alves (RN), anunciando a adesão de 100% da bancada buscou mostrar ao governo que ali há comando. E, se há, os deputados podem ir para um lado ou para outro. Unida, a bancada tem mais condições de, como posso chamar?, negociar princípios. E já pode se dizer mais governista do que o próprio PT, que teve duas defecções.
Reinaldo Azevedo 

Um Supremo já infiltrado
“Toda vez que a Constituição se refere a lei é no sentido formal e material. Ainda se pode imaginar uma medida provisória que tem força de lei, que passa depois pelo Congresso. Agora, essa transferência a um outro Poder de um ato que é próprio do Legislativo cria um problema”.

A fala é de Marco Aurélio de Mello, ministro do STF, comentando em tese o projeto aprovado na Câmara que transfere para a Presidência da República, até 2015, a prerrogativa de definir, por decreto, o salário mínimo. Segundo a Constituição, isso tem de ser feito por lei, no Congresso. Marco Aurélio, como fica evidente, considera o procedimento um tanto heterodoxo…

Reportagem do Estadão informa, no entanto, que ao menos um membro do tribunal não vê problema na lei aprovada. É… A coisa é complicada! Haver um ministro do STF — ainda que seja apenas 1 em 11 — que considere possível uma lei solapar um dispositivo constitucional é sinal de que o perigo bate à porta do estado de direito.

A minha questão é óbvia: se é possível, na questão dos salários, transferir uma prerrogativa constitucional do Congresso para o Executivo por meio de uma simples lei, por que não se pode fazer o mesmo em outros assuntos?

Reinaldo Azevedo
Fonte: 
http://oberrodaformiga.blogspot.com/2011/02/eles-fraudaram-constituicao.html
Ah! se tudo o que se relaciona a corrupção das governanças fosse publicado  pela mídia... o Brasil seria grande potência!
http://mudancaedivergencia.blogspot.com/2012/01/constituicao-brasileira-e-verdade-sobre.html